A lição de hoje veremos que a divisão na vida de uma família sempre causa uma enorme perturbação, correndo o risco de surgir um profundo sentimento de descontentamento que pode chegar até à morte.
Em toda a história da humanidade, observam-se muitas “quedas e devastações” decorrentes da divisão. Aconteceu, por exemplo, na partição de Israel, depois dos períodos áureos de Davi e Salomão, ocasião em que a terra santa foi dividida entre o Reino do Norte e o do Sul. Os dois Reinos foram decaindo gradativamente até serem levados cativos para terras longínquas. O Reino do Sul, Judá, ainda conseguiu retornar para Jerusalém. Entretanto, depois de subjugado, finalmente, no ano 70 d.C., foi esmagado por completo pelos romanos, acontecendo a Diáspora. Israel nunca mais foi o mesmo depois da divisão.
Queda e devastação foram observadas no Império Grego, depois da morte de Alexandre, o Grande,quando o reino foi dividido em quatro partes e, aos poucos, entrou em declínio, até ficar completamente absorvido pelo Império Romano, o qual, séculos depois, também entrou em colapso pela ocorrência desse mesmo processo.
A partir do século XV, o comércio de africanos como escravos para diversas partes do mundo, inclusive para o Brasil, não foi decorrente de invasões estrangeiras naquele continente, mas sim por causa de guerras entre etnias africanas inimigas. As pessoas das linhagens derrotadas nas batalhas eram vendidas aos comerciantes árabes e europeus, embarcando em navios negreiros para nunca mais retornarem à sua terra natal. "Assim, consta que o comércio de escravos que se estabeleceu no Atlântico entre 1450 e 1900 contabilizou a venda de cerca de 11.313.000 indivíduos”.
Atualmente, a África está dividida em 54 países, sendo o continente mais pobre do mundo, corroborando para tal circunstância, dentre outras, a profunda divisão étnica e cultural ali existente, gerando, ainda, prolongadas e sangrentas guerras em diversos países. Como mencionado, Jesus advertiu que um reino dividido contra si mesmo seria devastado. Muito lamentável.
Na história do século XX, de igual forma, alguns países tiveram grandes prejuízos por causa de divisões, como são os casos da Coreia e Alemanha, que se separaram após a 2ª Guerra Mundial.
Com a queda do muro de Berlim, no dia 9 de novembro de 1989, e a reunificação da Alemanha Oriental e Alemanha Ocidental, o novo país restaurado se transformou numa das maiores economias do mundo. A antiga Coreia, entretanto, nunca se reunificou. Hoje, a Coreia do Norte continua empobrecida, com graves agressões aos direitos humanos (desenvolveu apenas sua indústria bélica), e a Coreia do Sul ainda está em processo de desenvolvimento.
Da mesma forma que aconteceu com vários países do mundo ao longo da história, inúmeras famílias também têm se desintegrado por causa da divisão instalada. No início da década de 1980, o mundo parou para assistir pela TV o enlace matrimonial entre o príncipe Charles e a princesa Diana, considerado o casamento do século. Anos depois, tendo a divisão se alojado naquela família real, o lar não subsistiu. Com as traições, conspirações e mortes, a sua ruína foi completa.
Desfecho distinto aconteceu com o casal Clinton. Mesmo com a infidelidade do esposo e então presidente americano, Bill Clinton, sua esposa, Hillary, decidiu permanecer no casamento. Posteriormente, em 2009, ela assumiu o posto de Secretária de Estado do seu país e, atualmente (2015), está cotada para concorrer à presidência dos EUA pelo partido Democrata. O casal enfrentou toda sorte de turbulências e, mesmo assim, ficou junto e, hoje, pode continuar o projeto de vida em comum.
Como dito antes, “havendo divisão, surgirão novos projetos”. Esses novos planos podem dar muito certo numa empresa onde, fazendo a repartição em segmentos, são estabelecidas diversas personalidades jurídicas (divisões) para as áreas de seguros, previdência, capitalização bancária, etc. O problema é que isso não vale, necessariamente, para a família, projeto feito para durar para sempre. Portanto, quando a divisão acontece na família, faz emergir inexoravelmente a presunção de dificuldades.
A história da família do patriarca Isaque, filho de Abraão, apresenta, com riqueza de detalhes, pessoas muito comuns. As características desses personagens são vistas, ainda hoje, em qualquer família contemporânea. Não se trata, pois, de um épico judaico com elucubrações fantasiosas, mas sim da narrativa de uma família que conviveu com os defeitos dos seus membros e enfrentou, por isso, questões interpessoais mal resolvidas. O relato é crível, verossímil, plausível, real. Trata-se de um primor, uma obra perfeita e excelente.
I. Uma Família Abençoada
1. Pré-história
E importante conhecer a história anterior ao nascimento de Isaque, a fim de se dimensionar o status desse homem excepcional e, a partir daí, compreender melhor todo o desenrolar de sua vida familiar.
Um homem da antiguidade, para ser feliz, precisava de duas coisas básicas: possuir uma terra para viver e ter um filho para preservar sua memória. Abrão morava em Ur dos Caldeus, uma terra que não era sua, e cuidava de Ló, um filho que não era seu. Ele tinha riquezas, amizades, destaque social em Ur, porém não tinha uma família completa e feliz. Um dia, o Altíssimo o mandou ir embora, e ele foi. Era preciso somente seguir as instruções para receber uma terra como herança e poder gerar um filho. Abrão queria alcançar a promessa, e o primeiro passo para isso era chegar a bom termo em sua jornada.
O Todo-Poderoso não lhe deu um mapa; apenas o mandou sair de Ur, e ele partiu. Por que Deus fez isso? Porque o Eterno queria que Abrão fosse um referencial de fé para sua família e para todo mundo, porque nele seriam benditas todas as famílias da terra (Gn 12.3).
Deus prometeu ao patriarca fazer dele uma grande nação (Gn 12.2). Entretanto, depois, o Senhor lhe deu uma promoção: garantiu fazer dele “pai de multidões de nações” (Gn 17.4,5). Por isso, Deus mudou o nome de Abrão para Abraão, como também alterou o nome da sua esposa para Sara (Gn 17.15,16), pois ela seria “mãe das nações” e de “reis de povos”.
Muitos anos após chegar à terra de Canaã, e depois de diversos equívocos cometidos pelo ilustre casal, em cumprimento às inefáveis e gloriosas promessas de Deus, nasceu o herdeiro de todas as bênçãos que pendiam sobre Abraão e Sara, o qual foi criado em um lar no qual havia amor e carinho; talvez, em todos os tempos, ninguém tenha sido, como filho, tão amado como Isaque, que se constituiu em um presente inefável do Altíssimo na velhice dos seus pais e motivo de alegria (riso — Gn 21.6,7) para toda a sua família.
SUBSÍDIO
"A escolha do nome lsaque ("ele sorri")
Deve ter causado uma variedade de sentimentos a cada vez que era pronunciado. Mais importante, era um testemunho do poder de Deus em tornar realidade a sua promessa.
Em uma família de vigorosos desbravadores, lsaque era do tipo quieto, que se importava mais com seus próprios negócios, a menos que recebesse um chamado especifico para agir. Ele foi o filho único protegido desde que Sara livrou-se de Ismael.
Em sua própria família, lsaque ocupava a posição patriarcal, mas Rebeca tinha o poder. Ao invés de ser firme, lsaque achava mais fácil mentir ou condescender a fim de evitar confrontos. Apesar desses defeitos, lsaque fazia parte dos planos de Deus. O exemplo que recebera de seu pai incluía uma grande fé no único Deus verdadeiro. A promessa de Deus, de criar uma grande nação através da qual Ele abençoaria o mundo, foi passada de lsaque para seus filhos gêmeos.
Não é raro nos identificarmos com lsaque em suas fraquezas. Mas considere um instante: Deus trabalha através das pessoas a despeito de suas falhas. Ao orar, fale com Deus que você está disponível para ser usado por Ele. Você descobrirá que a disposição de Deus em usá-lo é ainda maior que o seu desejo de ser usado" (Bíblia de Estudo Aplicação Pessoal. Rio de Janeiro: CPAD, 2013, p.20).
2. Casamento no Senhor
Com uma educação primorosa, tanto no aspecto espiritual quanto no moral, Isaque transformou-se num homem excelente. Ele era um homem de oração. Depois da morte de sua mãe, Abraão entendeu que era chegado o momento do casamento de seu filho. Enquanto Eliézer foi buscar uma esposa da linhagem paterna para ele, Isaque foi orar (Gn 24.63). Ele conhecia o Senhor, o qual, muitas vezes, no futuro, se identificaria como sendo o Deus de Isaque.
Tudo aconteceu de forma maravilhosa. Isaque e Rebeca se casaram no Senhor, cheios de alegria (Gn 24.67). As coisas começaram muito bem, pois contaram com a direção do Altíssimo, a bênção dos pais e o sentimento de amor recíproco dos nubentes.
Eles formavam o casal sobre o qual repousariam bênçãos divinas inigualáveis. O casal se constituía em paradigma de amor conjugal, espiritualidade e moralidade. Eles tinham uma casa edificada sobre a Rocha, conheciam o Senhor e eram submissos à sua palavra.
Isaque e Rebeca viviam assim, compartilhando vidas, sonhos e emoções, como veremos a seguir.
3. História que se repete
O desejo de ter uma família feliz passava, necessariamente, pelo nascimento de um filho, porém Rebeca era estéril. Não haveria o futuro profético tão almejado sem um filho. Uma enorme dificuldade para o novo casal que, junto, sonhava com o nascimento de um herdeiro, para ser aquele através do qual descenderiam tantos como as estrelas do céu. Abraão e Sara, os pais de Isaque, passaram pelo mesmo problema com Sara, e eles tentaram resolver a questão pelo modo deles (com a egípcia Agar), e não deu muito certo, pois criaram um embaraço para toda a descendência, o qual, inclusive, permanece até hoje, o conflito árabe-israelense.
Isaque e Rebeca, ao contrário, não pegaram nenhum "atalho”; antes entraram pelo caminho da oração. Eram pessoas de fé. Após vinte anos de oração, Rebeca engravidou e nasceram-lhes gêmeos (Gn 25.20-21; 26). Glória a Deus, o qual, após isso, confirmou a promessa: a descendência de Isaque seria como as estrelas do céu (Gn 26.4). Por outro lado, a vida financeira e social da família de Isaque estava indo muito bem (Gn 26.12-14). Não lhes faltava nada. Afinal de contas, "a bênção do Senhor é que enriquece, e Ele não acrescenta dores” (Pv 10.22).
II. Problemas
1. Pais com preferências filiais
No momento em que mais a família precisava caminhar junto, formando um laço indestrutível, para exemplo em todas as famílias do mundo (Gn 12.3), um aspecto bastante ruim começou a se manifestar no caráter de Isaque e Rebeca (Gn 25.28).
Isaque se afeiçoou profundamente pelo filho Esaú, o qual era homem de ação, de luta, de embates, que sabia como alvejar, com seu arco, uma caça que se movia rapidamente, além de conhecer, talvez até melhor que a mãe, o tempero da comida que era agradável ao pai. Esaú era a satisfação para seu velho pai, porém não dava prazer ao Altíssimo. Ele era profano (Hb 12.16). O interessante é que a Bíblia não mostra Isaque repreendendo Esaú pelos seus graves equívocos comportamentais. Ao que tudo indica, o pai se omitiu de ensinar o filho como andar com o Todo-Poderoso, diferentemente da conduta de Abraão. Filhos criados de forma diferente apresentam sempre diferenças importantes. Os ensinamentos recebidos não foram suficientes para tornar Esaú em um homem de fé.
Rebeca, por sua vez, amava o caçula (Jacó), um moço pacato, de hábitos caseiros. Possivelmente, ele não sabia, sequer, utilizar arco e flecha e nunca tinha matado uma gazela. Isso não era importante para sua mãe, que gostava de vê-lo em casa, em atividades pouco agressivas. Talvez Rebeca se sentisse consolada por sua preferência por causa de uma revelação divina recebida, segundo a qual o filho maior serviria ao menor (Gn 25.23). Contudo, como a palavra profética não havia sido dirigida a Isaque, eventualmente ele não tenha acreditado na veracidade dessa promessa.
Pelo que se percebe do texto bíblico, essas preferências dos pais não eram em nada dissimuladas. Os irmãos, desde muito jovens, sabiam perfeitamente da forte divisão naquela abençoada família. Certamente, era uma questão incomoda para todos. As esposas de Esaú, os criados, os pastores de Isaque, todos, enfim, deveriam conhecer bem de perto o antigo problema familiar, através dos sinais claramente perceptíveis que Isaque e Rebeca emitiam. Os pais faziam questão de tomar partido. Isso é lamentável.
2. Filhos com cosmovisões distintas
Quando a divisão se instala na família, os danos são imprevisíveis. A maneira diferenciada dos pais tratarem os irmãos repercutiu, certamente, no desenvolvimento emocional de ambos. A Bíblia não diz expressamente, entretanto seria natural que o pai tratasse com desdém, vez por outra, a presença “desinteressante” do filho mais novo, ao passo que vibrasse e sorrisse efusivamente com as façanhas do primogênito. Em contrapartida, da mesma forma, é provável que a mãe sempre implicasse com os "maus modos” do mais velho e guardasse sempre a melhor comida para o caçula, dentre outras coisas pontuais, que, ao longo da vida, foram distanciando emocional e espiritualmente os pais dos filhos, bem como os irmãos entre si — que acabaram absorvendo cosmovisões diferentes. A vida de Jacó era agradável ao Eterno (Ml 1.2; Rm 9.13), já Esaú era sexualmente descontrolado (prova disso é que se casou com duas mulheres pagãs, as quais trouxeram muita aflição à família patriarcal (Gn 26.34,35) e, depois, com uma terceira (Gn 28.9)). Ele também não respeitava as coisas santas do Senhor. Era, por isso, fornicador e profano (Hb 12.16). Jacó valorizava as coisas espirituais, e Esaú as materiais (Gn 25.34), razão pela qual, aos quarenta anos, casou-se com duas mulheres ímpias (Gn 26.34), enquanto que o caçula decidiu esperar em Deus pela esposa certa (Gn 27.46), vindo a se casar somente aos 84 anos! (Gn 29 21-30)
Porque ninguém pode ser feliz se, no passado, rastros de sofrimento foram deixados sem solução, se inocentes ficaram no prejuízo e se lágrimas de aflição rolaram sem consolo. O Senhor pedirá contas um dia. Essa é uma lei inexorável. Imagine agora como a situação fica mais complicada se isso aconteceu em nome do Altíssimo? Que drama! Que incongruência! Pois foi exatamente tal circunstância que se deu na vida do patriarca Jacó. E foi por causa disso que o Senhor determinou seu retorno à terra de seus pais.
«Le Combat de Jacob avec l'Ange», détail Peinture murale par Eugène Delacroix (1798-1863) |
Uma má ação praticada contra alguém que amava você?
Uma lembrança triste, a qual você prefere não trazer à memória ou que você prefere não mencionar?
Talvez este seja o seu momento!
O Senhor, quando fala assim, o faz por amor, visando que as coisas voltem à normalidade e que a bênção dEle seja derramada abundantemente.
O reencontro marcou a completa reconciliação de irmãos que estavam separados há décadas. A família de Isaque agora poderia seguir seu caminho. Só o Criador cura graves traumas familiares.
“Nota o homem sincero e considera o que é reto, porque o futuro desse homem será de paz” (SI 37.37).
CONCLUSÃO
Os descendentes de Isaque experimentaram as consequências de uma danosa semente de discórdia plantada pelos próprios pais. Fica o exemplo. É preciso haver equilíbrio no tratamento dos filhos, confiança no caráter de Deus, que sempre cumpre as suas promessas, além de um profundo desejo de construir um lar que glorifique ao Senhor, que faça a diferença na terra. Este é o plano divino para os jovens que esperam no Senhor!
SUBSÍDIO BIBLIOLÓGICO
Um problema histórico. A rivalidade entre irmãos é um problema familiar histórico. Os casos são abundantes na Bíblia. Ismael perseguia a Isaque (Gl 4.29), Esaú e Jacó eram rivais desde o ventre (Gn 25.22,23), os irmãos de José tinham inveja dele (Gn 37.11), Miriã e Arão cobiçaram a posição de Moisés (Nm 12.1,2), os irmãos de Davi o desprezavam (1Sm 16.11; 17.28), dentre muitos outros casos. Assim, todas as famílias, independentemente da época em que viveram, são capazes de criar grandes zonas de conflitos entre irmãos. Cabe, porém, aos membros das famílias buscarem ao Senhor, para que haja controle sobre os impulsos da carne. Paulo roga que guardemos a unidade do Espírito pelo vínculo da paz (Ef 4.1,3). Essa regra serve tanto para a igreja como para a família.
Todo problema vivido dentro da família é relevante, pois quebra a unidade no lugar em que as pessoas têm a obrigação de se amarem. “Amem-se ou pereçam”, dizia certo poeta americano. Ademais, está escrito: “Mas, se alguém não tem cuidado dos seus e principalmente dos da sua família, negou a fé e é pior do que o infiel” (1 Tm 5.8).
Por outro lado, os problemas familiares são inevitáveis. Sempre existirão conflitos. Cedo ou tarde. Pequenos ou grandes. Com todos ou só com alguns. Isso faz parte da natureza humana decaída. Até na família terrena do Filho de Deus houve conflitos. Assim, não existem famílias sem problemas, mas há como os membros permanecerem sempre unidos (Pv 24.3,4). Não se pode permitir que o campo de treinamento de Deus (a família) se transforme no campo de batalha da carne. O Senhor pode estabelecer uma paz inefável e duradoura (Jo 14.27).
Fonte:
Livro de Apoio - Eu e minha casa - Orientações da Palavra de Deus para a Família do Século XXI - Comentarista Reynaldo Odilo
HENRY, Matthew. Comentário Bíblico do Novo Testamento. Volume 1, RJ: CPAD, 2010.
Comentário Bíblico BEACON Vol.1 RJ.CPAD.2015
Bíblia de Estudo Aplicação Pessoal
Bíblia de Estudo Pentecostal
Bíblia Defesa da Fé
Excelente texto, muito bem esplanado e edificante !
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