“Visto
que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos
céus, retenhamos firmemente a nossa confissão” Hb 4.14
Nesta altura, chegamos numa seção crucial da Carta aos Hebreus: A Supremacia do Sumo Sacerdócio de Cristo. O início dessa seção resgata o fato de que o Senhor Jesus, por intermédio de seu sacerdócio supremo, torna aberto o caminho para todas as pessoas aproximarem-se ao trono da Graça de Deus com confiança. Ora, nosso Senhor compartilhou a nossa humanidade e, por isso, ninguém melhor que Ele para compreender nossas fraquezas e debilidades. Por isso, precisamos de um mediador perfeito, “porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual a si mesmo se deu em resgate por todos” (1Tm 2.5,6). Por todos esses motivos, o Senhor Jesus (1) representa mais eficazmente todos os seres humanos do que os sacerdotes do Antigo Testamento; (2) compreende melhor a condição humana, pois a viveu em sua plenitude — Ele é verdadeiro Homem; (3) sua posição, junto ao Pai, o coloca em melhor posição para interceder por nós (1Jo 2.1).
Dentre muitos outros motivos, esses três levantados acima atestam claramente que o nosso Senhor é o Sumo Sacerdote por excelência. Nele, devemos depositar a nossa confiança!
Leitura Bíblica em classe: Hebreus 4.14-16; Hebreus 5.1-14
Sugestão Pedagógica
Uma boa sugestão é que você explique a classe a estrutura da ordem sacerdotal e levítica de Israel. Nesse sentido, vale a pena ler o capítulo 16 do livro de Levítico que descreve uma das principais cerimônias que o sumo sacerdote celebrava: o Dia da Expiação. Os capítulos 15 e 16.1-6 de 1 Crônicas também merecem atenção, pois eles destacam a organização dos levitas feita pelo rei Davi. Faça essa leitura com o auxílio da Bíblia de Estudo Pentecostal, editada pela CPAD. Boa aula!
Comentário de Hebreus 5.1-14
No capítulo 4.14-16, o autor introduziu o assunto da doutrina do sacerdócio. Aqui, ele tecerá mais detalhes da ordem sacerdotal levítica para contrastar posteriormente com o sacerdócio de Cristo, que é de outra ordem e superior ao levítico. A ideia do autor ao detalhar as qualificações exigidas do Sacerdócio Aarônico tem o propósito de mostrar, em primeiro lugar, que Jesus preenchera esses qualitativos. É bom ter sempre em mente que o autor já havia mostrado Jesus como sendo o Filho de Deus, fato esse que o identifica com a raça humana e o qualificaria para ministrar como Sumo Sacerdote.
“Porque todo sumo sacerdote, tomado dentre os homens, é constituído a favor dos homens nas coisas concernentes a Deus, para que ofereça dons e sacrifícios pelos pecados" (v. 1).
O autor de Hebreus revela que a primeira condição para alguém exercer o sacerdócio é que esse alguém tenha sido tomado dentre os homens. Somente um homem que possui a mesma natureza de outro homem poderia oficiar como sacerdote.
Nos primeiros capítulos de sua carta, o autor expusera uma farta argumentação em favor da humanidade de Jesus. Esses fatos agora se tornam de grande relevância quando ele apresenta-o como um Sumo Sacerdote constituído em favor dos homens. O sacerdote tinha como dever apresentar dons e sacrifícios. Alguns comentaristas, como, por exemplo, Robert Gundry (nascido em 1932), entendem que a expressão “dons e sacrifícios” é usada como sinônimo.1 Por outro lado, muitos outros eruditos, como Donald Guthrie (1916-1992), entendem que os sentidos desses termos devem ser mantidos distintos. Guthrie observa, por exemplo, que, nesse caso, os dons (dôra) são uma referência às ofertas de cereais, e os sacrifícios (thysias) às ofertas de sangue.2 Isso parece ser confirmado pelo uso do verbo grego prosphero (oferecer), que ocorre 19 vezes nessa carta e que mantém esse sentido de apresentar ofertas e sacrifícios diante de Deus. O sacerdote, portanto, deveria ser alguém que se identificasse com seus semelhantes. “E possa compadecer-se ternamente dos ignorantes e errados, pois também ele mesmo está rodeado de fraqueza" (v. 2). O termo grego metriopathein, traduzido como "compadecer", tem o sentido de alguém que consegue moderar suas paixões e sentimentos. Alexander Balmain Bruce (1831-1899) destaca que esse vocábulo
"Significa sentir-se com outro, mas sem abster-se de sentir contra ele; ser capaz de ter antipatia. Foi usado por Philo para descrever o sofrimento sóbrio de Abraão sobre a perda de Sara e a paciência de Jacó sob aflição. Aqui, parece ser empregado para denotar um estado de sentimento em relação ao ignorante e errado, com equilíbrio entre a severidade e indulgência excessiva".3
O sacerdote lidava com todos os tipos de desvios, erros e pecados cometidos pelo povo. Nessa teia de relacionamentos, ele via a fragilidade humana, o fracasso e o desespero. Sendo um homem colocado por Deus para representar os homens, o sacerdote sentia na sua própria alma o peso da miséria humana. Por outro lado, ele tinha diante de si a palavra de Deus, que o instruía a dar ao pecado o tratamento adequado, mesmo que o remédio fosse amargo. Era nesse momento que ele precisava agir com metripatheia, isto é, com compaixão!
“E, por esta causa, deve ele, tanto pelo povo com o também por si mesmo, fazer oferta pelos pecados" (v. 3). O sacerdote da antiga aliança vivia um dilema: ele necessitava fazer expiação não apenas pelos erros dos outros, mas também pelos seus. O sumo sacerdote deveria oferecer sacrifício primeiramente por si e, depois, pelo povo. "Depois, Arão oferecerá o novilho da oferta pela expiação, que será para ele; e fará expiação por si e pela sua casa” (Lv 16.6). Samuel Pérez Millos destaca que, na cerimônia da expiação dos sacerdotes e do povo, observam-se dois aspectos: primeiramente, o sacerdote, por uma questão do direito divino natural que lhe competia, deveria purificar-se de toda imundície pessoal, uma vez que isso tomava a oferta imunda e impossibilitava-o de ministrar diante de Deus. Por outro lado, o direito positivo prescrevia-lhe essa obrigação (Lv 4.3; 9,7; Hb 7.27; 9.7). Essa limitação, observa Millos, não é vista em Jesus Cristo, o Eterno Sumo Sacerdote, que não teve necessidade de purificar-se, visto ser imaculado e santo.4
“E ninguém toma para si essa honra, senão o que é chamado por Deus, como Arão" (v. 4). O autor usa a palavra grega timê, traduzida aqui como honra, para destacar a natureza do sacerdócio.5 O sacerdote era alguém chamado por Deus, e não pelos homens. Nos dias do Novo Testamento, o sistema sacerdotal corrompeu-se e tomou-se um cargo político, não mais sendo observadas as prescrições divinas para o exercício desse ofício (Êx 28.1; Lv 8.1; Nm 16.5; Sl 105.26). Todavia, como observa Craig S. Keener (nascido em 1960), o texto sugere que o autor refere-se ao sistema sacerdotal veterotestamentário, onde as exigências da Lei acerca do sacerdócio eram cumpridas, para contrastar com o sacerdócio de Jesus Cristo.6
“Assim, também Cristo não se glorificou a si mesmo, para se fazer sumo sacerdote, mas glorificou aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei” (v. 5). O autor mostra que Jesus cumpriu completamente todas as prescrições exigidas para o exercício do sacerdócio. Ele não se autoglorificou, constituindo-se a si mesmo como sacerdote. O léxico grego de Walter Bauer expressa bem o sentido do texto: "Ele não se elevou à glória do sumo sacerdócio”.7 No versículo 4, o autor fala da honra que Arão teve ao ser escolhido como sumo sacerdote; todavia, quando ele fala do sacerdócio de Jesus, mostra que o sacerdócio era algo inseparável de sua natureza. Deus dá testemunho de Jesus dizendo: "Tu és meu Filho”.8 Essa atribuição foi-lhe dada por Deus. Embora o autor não entre em detalhes sobre o momento no qual Jesus teria sido constituído sacerdote, os comentaristas destacam que a cristologia de Hebreus revela que Jesus é o Filho de Deus desde a eternidade (Hb 1.1,2; 5.8) e que foi vocacionado pelo Pai para ser Sumo Sacerdote. Nesse aspecto, a vocação aconteceu antes da encarnação, entrando, contudo, em vigor na paixão e morte, obtendo sua confirmação na ressurreição e ascensão.9
"Como também diz noutro lugar: Tu és sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque" (v. 6). É no capítulo 7 que a relação entre o sacerdócio de Jesus e Melquisedeque será explorada com maior profundidade pelo autor.10 Aqui, o comentarista bíblico Henry Orton Wiley mostra o que a analogia do sacerdócio de Melquisedeque revela em relação ao de Cristo.
1. Melquisedeque era sacerdote por seu próprio direito, e não em virtude de sua relação com os outros;
2. Era sacerdote para sempre, sem substitutos, sem sucessor;
3. Ele não foi ungido com óleo, mas com o Espírito Santo, como sacerdote do Altíssimo;
4. Não ofereceu sacrifícios de animais, mas pão e vinho, símbolos da Ceia, que, depois, Cristo instituiu;
5. E (talvez o principal pensamento na mente do escritor da Epístola) ele uniu as funções sacerdotais e reais, coisa estritamente proibida em Israel, mas a ser manifesta em Cristo, Sacerdote no seu trono (Zc 6.13).11
“O qual, nos dias da sua carne, oferecendo, com grande clamor e lágrimas, orações e súplicas ao que o podia livrar da morte, foi ouvido quanto ao que temia" (v. 7). A intercessão, característica de todo sumo sacerdote legitimamente constituído por Deus, é aplicada a Jesus de uma forma vívida e dramática pelo autor. A expressão "nos dias de sua carne" é uma referência à vida humana de Jesus. A humanidade de Jesus é sempre lembrada pelo autor de Hebreus como algo imprescindível para o exercício do sacerdócio. A expressão “grande clamor e lágrimas, orações e súplicas” não é encontrada nos evangelhos, mas aproxima-se dos acontecimentos que narram a agonia de Jesus no Getsêmani.
“E, levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se muito. Então, lhes disse: A minha alma está cheia de tristeza até à morte; ficai aqui e vigiai comigo. E, indo um pouco adiante, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: Meu Pai, se é possível, passa de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres” (Mt 26.37-39).
A tradução "tendo sido ouvido por causa da sua piedade” (ARA) é preferível a "foi ouvido quanto ao que temia" (ARC), já que o termo grego eulabeia mantém o sentido no Novo Testamento de “temor de Deus" e "reverência", destacando o aspecto da vida piedosa.12
Em que sentido Jesus teria sido ouvido? Ao longo da história da interpretação, pelo menos três formas de entendimentos desse texto têm-se destacado.
- Uma interpretação é que Jesus teria sido ouvido com base na sua piedade. Nesse aspecto, Jesus orou ao Pai para que este o livrasse da morte; todavia, orou também para que a vontade do Pai prevalecesse. Essa era a opinião de João Crisóstomo, de vários escritores medievais e dos comentaristas protestantes James Moffat, Franz Delitzsch e Wescott. Esses autores observam que a oração de Jesus foi ouvida por ter sido feita com temor reverente, e, assim, a vontade do Pai efetivou-se.
- Uma segunda interpretação é que Jesus teria orado para livrar-se do medo da morte. Essa interpretação foi seguida por João Calvino, Teodoro de Beza, Hugo Grócio, Johann Albrecht Bengel, Milligan e Michel. Trata-se de uma interpretação inusitada, mas não parece natural e nem de acordo com o contexto desse capítulo.
- Uma terceira interpretação entende que Jesus foi ouvido e foi libertado da morte através da ressurreição.13 Esse entendimento segue a antiga tradução dada pela Peshitta, que data do segundo século. A tradução da Peshitta diz: “E quando este estava vestido de carne, ofereceu petição e súplica com intenso clamor e lágrimas àquEle que podia ressuscitá-lo da morte, e foi ouvido”.14 Em uma nota de rodapé da versão em espanhol da Peshitta, está a explicação: “Essa expressão é fiel ao cumprimento de que o Pai não o abandonaria no Seol, aparte de que o Senhor sabia de antemão que havia vindo para morrer na cruz. O texto grego diz livrá-lo da morte".15 O erudito W. F. Mouton, um dos defensores dessa interpretação, destaca: “Estamos convencidos de que a oração não foi para que a morte fosse evitada, mas que houvesse segurança de libertação da mesma”.16 F. F. Bruce argumenta que o contexto de Hebreus 5, que é Salmos 22, favorece esse entendimento.
“Mas enquanto o Getsêmani provê a 'ilustração mais vívida’ das palavras de nosso autor, elas têm uma referência mais geral ao curso da humilhação e paixão de nosso Senhor. Mais ainda: Foram influenciadas pela linguagem do Salmo 22, um salmo cuja frequência como testemunium cristão já temos assinalado. 'Grande clamor e lágrimas’ é a súplica e queixa da primeira parte do salmo, enquanto a afirmação de que Cristo foi ‘ouvido por causa de seu temor reverente’ faz eco do Salmo 22.24: ‘Quando ele clamou, o ouviu’. Na interpretação cristológica desse salmo, essas palavras entendem-se como uma referência a ressurreição de Cristo".17
"Ainda que era Filho, aprendeu a obediência, por aquilo que padeceu” (v. 8). Sendo o verbo de Deus encarnado, Jesus viveu nas mesmas condições nas quais viveram os demais homens, exceto o pecado. Na sua humanidade, Ele também precisou exercitar a vida de obediência. O sentido dado pela tradução americana New English Bible (NEB) é que Jesus aprendeu na escola do sofrimento.
“E, sendo ele consumado, veio a ser a causa de eterna salvação para todos os que lhe obedecem" (v. 9). A expressão “sendo ele consumado" é traduzido na Almeida Revista e Atualizada como “tendo sido aperfeiçoado". Esse vocábulo é o particípio aoristo passivo de teleioô, significando: executar plenamente, consumar, acabar, aperfeiçoar.18 Adam Clarke traduz como “havendo terminado tudo’’, significando “havendo morto e ressuscitado”.19 O texto, portanto, não está sendo usado no sentido de que Jesus era imperfeito e precisava aperfeiçoar-se, mas, sim, no sentido de completude, isto é, que Ele completou a obra da Salvação. Em seu antigo comentário à carta aos Hebreus, Teodoreto de Cirro (393—457 d.C) destacou este sentido: “Com a expressão 'chegou à perfeição’ refere-se à ressurreição e à imortalidade, que são o cumprimento da economia da salvação”.20 O texto mostra que o plano da Salvação é para todos os homens (Jo 1.29; 3.16; 2 Pe 3.9; 1 Jo 2.2), mas ela só se efetiva naqueles que a recebem. Somente aqueles que recebem a Cristo e obedecem a Ele serão salvos. O autor conclui seu raciocínio dizendo que, tendo terminado o sacrifício do Calvário, Deus proclamou a Jesus Cristo, na sua ressurreição, Sumo Sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedeque.
“Chamado por Deus sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque’’ (v. 10). Ele voltará a tratar esse assunto com profundidade no capítulo 7; todavia, aqui, o autor introduz um parêntese exortativo, como ele já fizera em outros lugares.
“Do qual muito temos que dizer, de difícil interpretação, porquanto vos fizestes negligentes para ouvir" (v. 11). A doutrina do sacerdócio de Cristo é de suma importância para a vida cristã; o autor, todavia, observou que seus leitores davam sinais de arrefecimento na fé. Eles negligenciaram o aprendizado, sendo tardios para ouvir, e, como consequência, não estavam crescendo em maturidade espiritual. O autor tem consciência de que, quando voltar a tratar do assunto do sacerdócio de Cristo (no capítulo 7), seus leitores terão dificuldades de assimilar o seu ensino. O perfeito do indicativo ativo do verbo grego ginomai mostra que seus leitores nem sempre foram assim. Era hora de acordá-los novamente!
“Porque, devendo já ser mestres pelo tempo, ainda necessitais de que se vos tome a ensinar quais sejam os primeiros rudimentos das palavras de Deus; e vos haveis feito tais que necessitais de leite e não de sólido mantimento” (v. 12). A censura do autor é forte: eles deveriam ser mestres; no entanto, ainda se encontravam no jardim de infância da fé. Eles estavam atrasados na escola da fé e necessitavam refazer novamente as lições que já deveriam ter aprendido. O crescimento espiritual tem sua analogia no crescimento natural. A criança ainda não tem seus órgãos plenamente desenvolvidos; por isso, ela deve sofrer restrições quanto a determinados tipos de alimentos. Ela necessita de leite, que é necessário e adequado para esse estágio da vida. Para um adulto, porém, somente esse tipo de alimento não é suficiente. Os hebreus ainda estavam bebendo leite!
"Porque qualquer que ainda se alimenta de leite não está experimentado na palavra da justiça, porque é menino" (v. 13). A criança alimenta-se de leite, e o adulto de comida sólida. O autor sabe que a doutrina do sacerdócio exige uma maior dificuldade de compreensão — ela é para os que já são graduados.
“Mas o mantimento sólido é para os perfeitos, os quais, em razão do costume, têm os sentidos exercitados para discernir tanto o bem como o mal" (v. 14). Os cristãos maduros, que cresceram na fé, são aqueles aos quais o autor tem como "adequadamente treinados".21
A doutrina da superioridade sacerdotal de Cristo é transcendental aos princípios formadores da fé cristã e essencial à nossa fé.
Notas
1 GUNDRY, Robert. Commentary on Hebrews. Baker Academic, Grand Rapids, Michigan. EUA, 2010.
2 GUTHRIE, Donald. Hebreus - introdução e comentário. Editora Vida Nova, São Paulo.
3 BRUCE, Alexander Balmain. To The Epistle to Hebrews - the first apology of Christianity: An exegetical study. Charles Scribner’s Sons. Fifth Avenue, Nova York City, 1899.
4 MILLOS, Samuel Perez. Hebreos - comentário exegético al texto griego del Nuevo Testamento. Editorial CLIE.
5 Esse termo ocorre 41 vezes no Novo Testamento e 4 em Hebreus. Josefo usa essa palavra para referir-se à honra do ofício do sumo sacerdote (Josefo, Antiguidades HI, 188).
6 KEENER, C. S. Comentário del Contexto Cultural de la Biblia - Nuevo Testamento. Editorial Mundo Hispano, El Paso, Texas, EUA.
7 BAUER, Walter. A Greek-English Lexico of the New Testament and Other Early Christian Literature. The University of Chicago Press, EUA, 1979.
8 Veja a exposição de Thomas C. Edwards no seu Comentário Bíblico do Expositor - Carta aos Hebreus. Editora Koilas, Florianópolis, Santa Catarina, 2014. Edwards observa que o autor usa a palavra time {honra) para referir-se a chamada de Arão. Todavia, em relação a Jesus, ele usa o termo doksa, mostrando que o sacerdócio de Jesus era algo que fazia parte de sua personalidade , e não alguma coisa que foi acrescentada, como no caso de Arão.
9 FR IT Z , Laubach . Comentário aos Hebreus. Editora Esperança.
10 "O sacerdócio de Melquisedeque foi uma fonte de numerosas especulações pós-bíblicas que foi intensificada pela dificuldade do versículo do Salmo 110.4: "O Senhor jurou e não se arrependerá/Tu és sacerdote para sempre/ segundo a ordem de Melquisedeque”. Geralmente, é acreditado que o Melquisedeque mencionado aqui e o de Gênesis são o mesmo” (Enciclopaedia Judaica, 22 volumes. Second Edition, vol. 14. Pp .11. Macmillan Reference, Farmington Hills, MI, EUA, 2007.
11 WILEY, Orton . A Excelência da Nova Aliança em Cristo - comentário exaustivo da carta aos Hebreus. Editora Central Gospel.
12 Adam Clarke fez uma paráfrase de Hebreu s 5.7: "Jesus Cristo, nos dias de sua carne (porque Ele foi encarnado para redimir a semente de Abraão, a raça humana caída) e, em seus sofrimentos expiatórios, quando representava a raça humana, oferecia orações e súplicas com forte clamor e lágrimas àquEle que podia salvá-lo da morte. A intercessão prevaleceu, a paixão e o sacrifício foram aceitos, o aguilhão da morte foi tomado, e Satanás destronado” (CLARKE, Adam. Hebreos - Comentário de La Santa Biblia, tomo III, pp 594, Nuevo Testamento. Casa Nazarena de Publicaciones, Lenexa, EUA).
13 Veja uma análise detalhada no comentário: Epístola aos Hebreus - Jesus Cristo, Hoje. Neil R. Lightfoot. Editora Vida Cristã.
14 Biblia Peshita - Traducckm de Los Antigos Manuscritos Arameos. Holman Bible Publishers. Nashville, Tennessee, EUA.
15 Idem.
16 ELLIC0TT, Charles John. A Bible Commentary For English Readers. Cassell and Company , Londres, 1905.
17 BRUCE, F. F. La Epistola a Los Hebreos. Libros Desafio. Grand Rapids, Michigan, EUA.
18 MOUCE, William D. Léxico Grego Analítico. Editora Vida Nova.
19 CLARKE, Adam. Hebreos - comentário de la Santa Biblia, tom o III. Editora Nazarena, Lenexa, EUA.
20 CIRO, Teodoreto. Interpretacion Sobre La Carta a Los Hebreos. La Biblia Comentada por Los Padres de La Iglesia. Ciudad Nueva, Madrid, Espana.
21 BUCHANAN, George Wesley. To The Hebrews - The Anchor Bible. Doubleday & Company , INC . Garden City, Nova York, EUA, 1972.
Fonte:
Lições Bíblicas 1º Trim.2018 - A supremacia de Cristo - Fé, esperança e ânimo na Carta aos Hebreus - Comentarista: José Gonçalves
Livro de Apoio – A Supremacia de Cristo - Fé, Esperança e Ânimo na Carta aos Hebreus - José Gonçalves
Nesta altura, chegamos numa seção crucial da Carta aos Hebreus: A Supremacia do Sumo Sacerdócio de Cristo. O início dessa seção resgata o fato de que o Senhor Jesus, por intermédio de seu sacerdócio supremo, torna aberto o caminho para todas as pessoas aproximarem-se ao trono da Graça de Deus com confiança. Ora, nosso Senhor compartilhou a nossa humanidade e, por isso, ninguém melhor que Ele para compreender nossas fraquezas e debilidades. Por isso, precisamos de um mediador perfeito, “porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual a si mesmo se deu em resgate por todos” (1Tm 2.5,6). Por todos esses motivos, o Senhor Jesus (1) representa mais eficazmente todos os seres humanos do que os sacerdotes do Antigo Testamento; (2) compreende melhor a condição humana, pois a viveu em sua plenitude — Ele é verdadeiro Homem; (3) sua posição, junto ao Pai, o coloca em melhor posição para interceder por nós (1Jo 2.1).
Dentre muitos outros motivos, esses três levantados acima atestam claramente que o nosso Senhor é o Sumo Sacerdote por excelência. Nele, devemos depositar a nossa confiança!
Leitura Bíblica em classe: Hebreus 4.14-16; Hebreus 5.1-14
Sugestão Pedagógica
Uma boa sugestão é que você explique a classe a estrutura da ordem sacerdotal e levítica de Israel. Nesse sentido, vale a pena ler o capítulo 16 do livro de Levítico que descreve uma das principais cerimônias que o sumo sacerdote celebrava: o Dia da Expiação. Os capítulos 15 e 16.1-6 de 1 Crônicas também merecem atenção, pois eles destacam a organização dos levitas feita pelo rei Davi. Faça essa leitura com o auxílio da Bíblia de Estudo Pentecostal, editada pela CPAD. Boa aula!
Comentário de Hebreus 5.1-14
No capítulo 4.14-16, o autor introduziu o assunto da doutrina do sacerdócio. Aqui, ele tecerá mais detalhes da ordem sacerdotal levítica para contrastar posteriormente com o sacerdócio de Cristo, que é de outra ordem e superior ao levítico. A ideia do autor ao detalhar as qualificações exigidas do Sacerdócio Aarônico tem o propósito de mostrar, em primeiro lugar, que Jesus preenchera esses qualitativos. É bom ter sempre em mente que o autor já havia mostrado Jesus como sendo o Filho de Deus, fato esse que o identifica com a raça humana e o qualificaria para ministrar como Sumo Sacerdote.
“Porque todo sumo sacerdote, tomado dentre os homens, é constituído a favor dos homens nas coisas concernentes a Deus, para que ofereça dons e sacrifícios pelos pecados" (v. 1).
O autor de Hebreus revela que a primeira condição para alguém exercer o sacerdócio é que esse alguém tenha sido tomado dentre os homens. Somente um homem que possui a mesma natureza de outro homem poderia oficiar como sacerdote.
Nos primeiros capítulos de sua carta, o autor expusera uma farta argumentação em favor da humanidade de Jesus. Esses fatos agora se tornam de grande relevância quando ele apresenta-o como um Sumo Sacerdote constituído em favor dos homens. O sacerdote tinha como dever apresentar dons e sacrifícios. Alguns comentaristas, como, por exemplo, Robert Gundry (nascido em 1932), entendem que a expressão “dons e sacrifícios” é usada como sinônimo.1 Por outro lado, muitos outros eruditos, como Donald Guthrie (1916-1992), entendem que os sentidos desses termos devem ser mantidos distintos. Guthrie observa, por exemplo, que, nesse caso, os dons (dôra) são uma referência às ofertas de cereais, e os sacrifícios (thysias) às ofertas de sangue.2 Isso parece ser confirmado pelo uso do verbo grego prosphero (oferecer), que ocorre 19 vezes nessa carta e que mantém esse sentido de apresentar ofertas e sacrifícios diante de Deus. O sacerdote, portanto, deveria ser alguém que se identificasse com seus semelhantes. “E possa compadecer-se ternamente dos ignorantes e errados, pois também ele mesmo está rodeado de fraqueza" (v. 2). O termo grego metriopathein, traduzido como "compadecer", tem o sentido de alguém que consegue moderar suas paixões e sentimentos. Alexander Balmain Bruce (1831-1899) destaca que esse vocábulo
"Significa sentir-se com outro, mas sem abster-se de sentir contra ele; ser capaz de ter antipatia. Foi usado por Philo para descrever o sofrimento sóbrio de Abraão sobre a perda de Sara e a paciência de Jacó sob aflição. Aqui, parece ser empregado para denotar um estado de sentimento em relação ao ignorante e errado, com equilíbrio entre a severidade e indulgência excessiva".3
O sacerdote lidava com todos os tipos de desvios, erros e pecados cometidos pelo povo. Nessa teia de relacionamentos, ele via a fragilidade humana, o fracasso e o desespero. Sendo um homem colocado por Deus para representar os homens, o sacerdote sentia na sua própria alma o peso da miséria humana. Por outro lado, ele tinha diante de si a palavra de Deus, que o instruía a dar ao pecado o tratamento adequado, mesmo que o remédio fosse amargo. Era nesse momento que ele precisava agir com metripatheia, isto é, com compaixão!
“E, por esta causa, deve ele, tanto pelo povo com o também por si mesmo, fazer oferta pelos pecados" (v. 3). O sacerdote da antiga aliança vivia um dilema: ele necessitava fazer expiação não apenas pelos erros dos outros, mas também pelos seus. O sumo sacerdote deveria oferecer sacrifício primeiramente por si e, depois, pelo povo. "Depois, Arão oferecerá o novilho da oferta pela expiação, que será para ele; e fará expiação por si e pela sua casa” (Lv 16.6). Samuel Pérez Millos destaca que, na cerimônia da expiação dos sacerdotes e do povo, observam-se dois aspectos: primeiramente, o sacerdote, por uma questão do direito divino natural que lhe competia, deveria purificar-se de toda imundície pessoal, uma vez que isso tomava a oferta imunda e impossibilitava-o de ministrar diante de Deus. Por outro lado, o direito positivo prescrevia-lhe essa obrigação (Lv 4.3; 9,7; Hb 7.27; 9.7). Essa limitação, observa Millos, não é vista em Jesus Cristo, o Eterno Sumo Sacerdote, que não teve necessidade de purificar-se, visto ser imaculado e santo.4
“E ninguém toma para si essa honra, senão o que é chamado por Deus, como Arão" (v. 4). O autor usa a palavra grega timê, traduzida aqui como honra, para destacar a natureza do sacerdócio.5 O sacerdote era alguém chamado por Deus, e não pelos homens. Nos dias do Novo Testamento, o sistema sacerdotal corrompeu-se e tomou-se um cargo político, não mais sendo observadas as prescrições divinas para o exercício desse ofício (Êx 28.1; Lv 8.1; Nm 16.5; Sl 105.26). Todavia, como observa Craig S. Keener (nascido em 1960), o texto sugere que o autor refere-se ao sistema sacerdotal veterotestamentário, onde as exigências da Lei acerca do sacerdócio eram cumpridas, para contrastar com o sacerdócio de Jesus Cristo.6
“Assim, também Cristo não se glorificou a si mesmo, para se fazer sumo sacerdote, mas glorificou aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei” (v. 5). O autor mostra que Jesus cumpriu completamente todas as prescrições exigidas para o exercício do sacerdócio. Ele não se autoglorificou, constituindo-se a si mesmo como sacerdote. O léxico grego de Walter Bauer expressa bem o sentido do texto: "Ele não se elevou à glória do sumo sacerdócio”.7 No versículo 4, o autor fala da honra que Arão teve ao ser escolhido como sumo sacerdote; todavia, quando ele fala do sacerdócio de Jesus, mostra que o sacerdócio era algo inseparável de sua natureza. Deus dá testemunho de Jesus dizendo: "Tu és meu Filho”.8 Essa atribuição foi-lhe dada por Deus. Embora o autor não entre em detalhes sobre o momento no qual Jesus teria sido constituído sacerdote, os comentaristas destacam que a cristologia de Hebreus revela que Jesus é o Filho de Deus desde a eternidade (Hb 1.1,2; 5.8) e que foi vocacionado pelo Pai para ser Sumo Sacerdote. Nesse aspecto, a vocação aconteceu antes da encarnação, entrando, contudo, em vigor na paixão e morte, obtendo sua confirmação na ressurreição e ascensão.9
"Como também diz noutro lugar: Tu és sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque" (v. 6). É no capítulo 7 que a relação entre o sacerdócio de Jesus e Melquisedeque será explorada com maior profundidade pelo autor.10 Aqui, o comentarista bíblico Henry Orton Wiley mostra o que a analogia do sacerdócio de Melquisedeque revela em relação ao de Cristo.
1. Melquisedeque era sacerdote por seu próprio direito, e não em virtude de sua relação com os outros;
2. Era sacerdote para sempre, sem substitutos, sem sucessor;
3. Ele não foi ungido com óleo, mas com o Espírito Santo, como sacerdote do Altíssimo;
4. Não ofereceu sacrifícios de animais, mas pão e vinho, símbolos da Ceia, que, depois, Cristo instituiu;
5. E (talvez o principal pensamento na mente do escritor da Epístola) ele uniu as funções sacerdotais e reais, coisa estritamente proibida em Israel, mas a ser manifesta em Cristo, Sacerdote no seu trono (Zc 6.13).11
“O qual, nos dias da sua carne, oferecendo, com grande clamor e lágrimas, orações e súplicas ao que o podia livrar da morte, foi ouvido quanto ao que temia" (v. 7). A intercessão, característica de todo sumo sacerdote legitimamente constituído por Deus, é aplicada a Jesus de uma forma vívida e dramática pelo autor. A expressão "nos dias de sua carne" é uma referência à vida humana de Jesus. A humanidade de Jesus é sempre lembrada pelo autor de Hebreus como algo imprescindível para o exercício do sacerdócio. A expressão “grande clamor e lágrimas, orações e súplicas” não é encontrada nos evangelhos, mas aproxima-se dos acontecimentos que narram a agonia de Jesus no Getsêmani.
“E, levando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se muito. Então, lhes disse: A minha alma está cheia de tristeza até à morte; ficai aqui e vigiai comigo. E, indo um pouco adiante, prostrou-se sobre o seu rosto, orando e dizendo: Meu Pai, se é possível, passa de mim este cálice; todavia, não seja como eu quero, mas como tu queres” (Mt 26.37-39).
A tradução "tendo sido ouvido por causa da sua piedade” (ARA) é preferível a "foi ouvido quanto ao que temia" (ARC), já que o termo grego eulabeia mantém o sentido no Novo Testamento de “temor de Deus" e "reverência", destacando o aspecto da vida piedosa.12
Em que sentido Jesus teria sido ouvido? Ao longo da história da interpretação, pelo menos três formas de entendimentos desse texto têm-se destacado.
- Uma interpretação é que Jesus teria sido ouvido com base na sua piedade. Nesse aspecto, Jesus orou ao Pai para que este o livrasse da morte; todavia, orou também para que a vontade do Pai prevalecesse. Essa era a opinião de João Crisóstomo, de vários escritores medievais e dos comentaristas protestantes James Moffat, Franz Delitzsch e Wescott. Esses autores observam que a oração de Jesus foi ouvida por ter sido feita com temor reverente, e, assim, a vontade do Pai efetivou-se.
- Uma segunda interpretação é que Jesus teria orado para livrar-se do medo da morte. Essa interpretação foi seguida por João Calvino, Teodoro de Beza, Hugo Grócio, Johann Albrecht Bengel, Milligan e Michel. Trata-se de uma interpretação inusitada, mas não parece natural e nem de acordo com o contexto desse capítulo.
- Uma terceira interpretação entende que Jesus foi ouvido e foi libertado da morte através da ressurreição.13 Esse entendimento segue a antiga tradução dada pela Peshitta, que data do segundo século. A tradução da Peshitta diz: “E quando este estava vestido de carne, ofereceu petição e súplica com intenso clamor e lágrimas àquEle que podia ressuscitá-lo da morte, e foi ouvido”.14 Em uma nota de rodapé da versão em espanhol da Peshitta, está a explicação: “Essa expressão é fiel ao cumprimento de que o Pai não o abandonaria no Seol, aparte de que o Senhor sabia de antemão que havia vindo para morrer na cruz. O texto grego diz livrá-lo da morte".15 O erudito W. F. Mouton, um dos defensores dessa interpretação, destaca: “Estamos convencidos de que a oração não foi para que a morte fosse evitada, mas que houvesse segurança de libertação da mesma”.16 F. F. Bruce argumenta que o contexto de Hebreus 5, que é Salmos 22, favorece esse entendimento.
“Mas enquanto o Getsêmani provê a 'ilustração mais vívida’ das palavras de nosso autor, elas têm uma referência mais geral ao curso da humilhação e paixão de nosso Senhor. Mais ainda: Foram influenciadas pela linguagem do Salmo 22, um salmo cuja frequência como testemunium cristão já temos assinalado. 'Grande clamor e lágrimas’ é a súplica e queixa da primeira parte do salmo, enquanto a afirmação de que Cristo foi ‘ouvido por causa de seu temor reverente’ faz eco do Salmo 22.24: ‘Quando ele clamou, o ouviu’. Na interpretação cristológica desse salmo, essas palavras entendem-se como uma referência a ressurreição de Cristo".17
"Ainda que era Filho, aprendeu a obediência, por aquilo que padeceu” (v. 8). Sendo o verbo de Deus encarnado, Jesus viveu nas mesmas condições nas quais viveram os demais homens, exceto o pecado. Na sua humanidade, Ele também precisou exercitar a vida de obediência. O sentido dado pela tradução americana New English Bible (NEB) é que Jesus aprendeu na escola do sofrimento.
“E, sendo ele consumado, veio a ser a causa de eterna salvação para todos os que lhe obedecem" (v. 9). A expressão “sendo ele consumado" é traduzido na Almeida Revista e Atualizada como “tendo sido aperfeiçoado". Esse vocábulo é o particípio aoristo passivo de teleioô, significando: executar plenamente, consumar, acabar, aperfeiçoar.18 Adam Clarke traduz como “havendo terminado tudo’’, significando “havendo morto e ressuscitado”.19 O texto, portanto, não está sendo usado no sentido de que Jesus era imperfeito e precisava aperfeiçoar-se, mas, sim, no sentido de completude, isto é, que Ele completou a obra da Salvação. Em seu antigo comentário à carta aos Hebreus, Teodoreto de Cirro (393—457 d.C) destacou este sentido: “Com a expressão 'chegou à perfeição’ refere-se à ressurreição e à imortalidade, que são o cumprimento da economia da salvação”.20 O texto mostra que o plano da Salvação é para todos os homens (Jo 1.29; 3.16; 2 Pe 3.9; 1 Jo 2.2), mas ela só se efetiva naqueles que a recebem. Somente aqueles que recebem a Cristo e obedecem a Ele serão salvos. O autor conclui seu raciocínio dizendo que, tendo terminado o sacrifício do Calvário, Deus proclamou a Jesus Cristo, na sua ressurreição, Sumo Sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedeque.
“Chamado por Deus sumo sacerdote, segundo a ordem de Melquisedeque’’ (v. 10). Ele voltará a tratar esse assunto com profundidade no capítulo 7; todavia, aqui, o autor introduz um parêntese exortativo, como ele já fizera em outros lugares.
“Do qual muito temos que dizer, de difícil interpretação, porquanto vos fizestes negligentes para ouvir" (v. 11). A doutrina do sacerdócio de Cristo é de suma importância para a vida cristã; o autor, todavia, observou que seus leitores davam sinais de arrefecimento na fé. Eles negligenciaram o aprendizado, sendo tardios para ouvir, e, como consequência, não estavam crescendo em maturidade espiritual. O autor tem consciência de que, quando voltar a tratar do assunto do sacerdócio de Cristo (no capítulo 7), seus leitores terão dificuldades de assimilar o seu ensino. O perfeito do indicativo ativo do verbo grego ginomai mostra que seus leitores nem sempre foram assim. Era hora de acordá-los novamente!
“Porque, devendo já ser mestres pelo tempo, ainda necessitais de que se vos tome a ensinar quais sejam os primeiros rudimentos das palavras de Deus; e vos haveis feito tais que necessitais de leite e não de sólido mantimento” (v. 12). A censura do autor é forte: eles deveriam ser mestres; no entanto, ainda se encontravam no jardim de infância da fé. Eles estavam atrasados na escola da fé e necessitavam refazer novamente as lições que já deveriam ter aprendido. O crescimento espiritual tem sua analogia no crescimento natural. A criança ainda não tem seus órgãos plenamente desenvolvidos; por isso, ela deve sofrer restrições quanto a determinados tipos de alimentos. Ela necessita de leite, que é necessário e adequado para esse estágio da vida. Para um adulto, porém, somente esse tipo de alimento não é suficiente. Os hebreus ainda estavam bebendo leite!
"Porque qualquer que ainda se alimenta de leite não está experimentado na palavra da justiça, porque é menino" (v. 13). A criança alimenta-se de leite, e o adulto de comida sólida. O autor sabe que a doutrina do sacerdócio exige uma maior dificuldade de compreensão — ela é para os que já são graduados.
“Mas o mantimento sólido é para os perfeitos, os quais, em razão do costume, têm os sentidos exercitados para discernir tanto o bem como o mal" (v. 14). Os cristãos maduros, que cresceram na fé, são aqueles aos quais o autor tem como "adequadamente treinados".21
A doutrina da superioridade sacerdotal de Cristo é transcendental aos princípios formadores da fé cristã e essencial à nossa fé.
Notas
1 GUNDRY, Robert. Commentary on Hebrews. Baker Academic, Grand Rapids, Michigan. EUA, 2010.
2 GUTHRIE, Donald. Hebreus - introdução e comentário. Editora Vida Nova, São Paulo.
3 BRUCE, Alexander Balmain. To The Epistle to Hebrews - the first apology of Christianity: An exegetical study. Charles Scribner’s Sons. Fifth Avenue, Nova York City, 1899.
4 MILLOS, Samuel Perez. Hebreos - comentário exegético al texto griego del Nuevo Testamento. Editorial CLIE.
5 Esse termo ocorre 41 vezes no Novo Testamento e 4 em Hebreus. Josefo usa essa palavra para referir-se à honra do ofício do sumo sacerdote (Josefo, Antiguidades HI, 188).
6 KEENER, C. S. Comentário del Contexto Cultural de la Biblia - Nuevo Testamento. Editorial Mundo Hispano, El Paso, Texas, EUA.
7 BAUER, Walter. A Greek-English Lexico of the New Testament and Other Early Christian Literature. The University of Chicago Press, EUA, 1979.
8 Veja a exposição de Thomas C. Edwards no seu Comentário Bíblico do Expositor - Carta aos Hebreus. Editora Koilas, Florianópolis, Santa Catarina, 2014. Edwards observa que o autor usa a palavra time {honra) para referir-se a chamada de Arão. Todavia, em relação a Jesus, ele usa o termo doksa, mostrando que o sacerdócio de Jesus era algo que fazia parte de sua personalidade , e não alguma coisa que foi acrescentada, como no caso de Arão.
9 FR IT Z , Laubach . Comentário aos Hebreus. Editora Esperança.
10 "O sacerdócio de Melquisedeque foi uma fonte de numerosas especulações pós-bíblicas que foi intensificada pela dificuldade do versículo do Salmo 110.4: "O Senhor jurou e não se arrependerá/Tu és sacerdote para sempre/ segundo a ordem de Melquisedeque”. Geralmente, é acreditado que o Melquisedeque mencionado aqui e o de Gênesis são o mesmo” (Enciclopaedia Judaica, 22 volumes. Second Edition, vol. 14. Pp .11. Macmillan Reference, Farmington Hills, MI, EUA, 2007.
11 WILEY, Orton . A Excelência da Nova Aliança em Cristo - comentário exaustivo da carta aos Hebreus. Editora Central Gospel.
12 Adam Clarke fez uma paráfrase de Hebreu s 5.7: "Jesus Cristo, nos dias de sua carne (porque Ele foi encarnado para redimir a semente de Abraão, a raça humana caída) e, em seus sofrimentos expiatórios, quando representava a raça humana, oferecia orações e súplicas com forte clamor e lágrimas àquEle que podia salvá-lo da morte. A intercessão prevaleceu, a paixão e o sacrifício foram aceitos, o aguilhão da morte foi tomado, e Satanás destronado” (CLARKE, Adam. Hebreos - Comentário de La Santa Biblia, tomo III, pp 594, Nuevo Testamento. Casa Nazarena de Publicaciones, Lenexa, EUA).
13 Veja uma análise detalhada no comentário: Epístola aos Hebreus - Jesus Cristo, Hoje. Neil R. Lightfoot. Editora Vida Cristã.
14 Biblia Peshita - Traducckm de Los Antigos Manuscritos Arameos. Holman Bible Publishers. Nashville, Tennessee, EUA.
15 Idem.
16 ELLIC0TT, Charles John. A Bible Commentary For English Readers. Cassell and Company , Londres, 1905.
17 BRUCE, F. F. La Epistola a Los Hebreos. Libros Desafio. Grand Rapids, Michigan, EUA.
18 MOUCE, William D. Léxico Grego Analítico. Editora Vida Nova.
19 CLARKE, Adam. Hebreos - comentário de la Santa Biblia, tom o III. Editora Nazarena, Lenexa, EUA.
20 CIRO, Teodoreto. Interpretacion Sobre La Carta a Los Hebreos. La Biblia Comentada por Los Padres de La Iglesia. Ciudad Nueva, Madrid, Espana.
21 BUCHANAN, George Wesley. To The Hebrews - The Anchor Bible. Doubleday & Company , INC . Garden City, Nova York, EUA, 1972.
Fonte:
Lições Bíblicas 1º Trim.2018 - A supremacia de Cristo - Fé, esperança e ânimo na Carta aos Hebreus - Comentarista: José Gonçalves
Livro de Apoio – A Supremacia de Cristo - Fé, Esperança e Ânimo na Carta aos Hebreus - José Gonçalves
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