"Portanto, o mesmo Senhor vos dará um sinal: eis que uma virgem conceberá, e dará à luz um filho, e será o seu nome Emanuel" Isaías 7:14
LEITURA BÍBLICA: LIVRO DE ISAÍAS 7.1-25
“O profeta aconselhou Acaz a buscar um sinal de Yahweh
[...], mas o rei já havia determinado no coração buscar socorro com o rei da
Assíria. Isaías então profetizou que uma virgem conceberia, e o seu filho seria
chamado de Emanuel. Este seria o sinal da misericórdia de Deus, a despeito de
toda a incredulidade de Acaz. Na providência de Deus, aquEle Filho, no sentido
messiânico, era Jesus de Nazaré. Mas o sinal específico para Acaz e sua corte
era uma criança, não identificada, que nasceria de uma jovem mulher conhecida
do rei. Antes que a criança alcançasse a idade de discernir entre o bem e o
mal, Rezim e Peca perderiam os seus tronos, e Acaz começaria a sofrer a
depredação de seu aliado assírio. Damasco caiu em 732 e Rezim, seu rei, foi sumariamente
executado. Quase simultaneamente, Peca foi assassinado, e em seu lugar
levantou-se o rei Oseias, um aliado dos Assírios. Assim, o cumprimento da
palavra profética ocorreu dentro de dois anos. Sete anos mais tarde, Salmaneser
V finalmente tomou a cidade de Samaria, causando também espanto e terror ao
reino de Acaz. Não foi senão no reinado de Ezequias, cerca de dez anos depois,
que a Assíria iniciou suas campanhas sistemáticas contra Judá e quase eliminou
o reino do Sul” (MERRILL, H. Eugene. História de Israel no Antigo Testamento: O reino de sacerdotes que Deus colocou entre as nações. 12ª
Edição. RJ: CPAD, 2013. p.451).
O Emanuel, Deus conosco, é a maior prova de amor e cuidado de Deus para com seus filhos.
Ao Professor (interação)
Alguns alunos poderão confundir dois países
chamados Síria (também chamada de Arã), cuja capital era Damasco, e a Assíria,
cuja capital era Nínive. Explique que o primeiro se refere a um país próximo ao
norte de Israel que nunca chegou a ser uma grande nação. A Assíria tornou-se um
império mundial e conquistou Israel (o Reino do Norte), levando-o para o
cativeiro. Outro fato a destacar é que Acaz oferecia sacrifícios aos deuses
falsos da Síria porque erroneamente achou que estes supostamente estavam livrando
aquele país. Mas nessa profecia de Isaías, o rei é alertado para o fato de que
a Síria também cairia por intermédio do Império Assírio, assim como todos os
demais países idólatras seriam castigados.
“E, respondendo o anjo, disse-lhe: Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o Santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus” Lucas 1.35
A importância de
Isaías para a compreensão a respeito do Messias e inquestionável. Prova disso
são as frequentes citações de seus oráculos no Novo Testamento. Pode-se dizer
também que os seus textos messiânicos foram tomados teologicamente pelo
cristianismo primitivo como um dos principais fundamentos para a compreensão da
natureza e atuação de Jesus de Nazaré na condição de Messias prometido,
particularmente em comunidades do primeiro século, formadas, em sua maioria,
por judeus cristãos, pois era necessário aprofundar a dimensão cristológica com
o objetivo de diminuir a possibilidade de se negar o caráter messiânico de
Jesus.
Entre os títulos
messiânicos da tradição veterotestamentária, interpretados como sendo de Jesus
de Nazaré, um em particular recebeu destaque: “Emanuel”, que, no hebraico, é a
junção de dois termos immánu, que
significa “conosco” e EI, que significa
“Deus” ou “Senhor”, literalmente “conosco [está] Deus”. O título foi uma
apropriação teológica do livro atribuído ao profeta Isaías, já que a expressão
aparece em dois versículos e, indiretamente, em um versículo. Seguem os
versículos:
1) “Portanto, o
mesmo Senhor vos dará um sinal: eis que uma virgem conceberá, e dará à luz um
filho, e será o seu nome Emanuel” (Is 7.14).
2) “[...] e passará a
Judá, inundando-o, e irá passando por ele, e chegará até ao pescoço; e a
extensão de suas asas encherá a largura da tua terra, ó Emanuel (Is
8.8)”.
3) “Tomai juntamente
conselho, e ele será dissipado; dizei a palavra, e ela não subsistirá, porque Deus
é conosco” (Is 8.10).
Para saber um pouco
mais sobre o título messiânico Emanuel, é necessário apresentar algumas
considerações a partir do seguinte questionamento: Em que contexto
histórico-teológico, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, surge o conceito
de “Emanuel”?
O questionamento se mostra relevante diante do percurso histórico
de, aproximadamente, 800 anos entre o surgimento do termo e sua inserção no
Evangelho de Mateus. Além disso, qual a importância do conceito de Emanuel para
os cristãos em geral?
Essas são questões que serão trabalhadas ao longo deste
capítulo.
"Eis que a virgem conceberá, e dará a luz um filho, e chamá-lo-ão pelo nome de EMANUEL, que traduzido é: Deus conosco." Mateus 1:23
Uma das mais belas profecias de Isaías é a que ele aponta para o maior gesto de amor de Deus para com a humanidade: a vinda de Cristo ao mundo, o Emanuel, o “Deus conosco”.
I - O CONTEXTO IMEDIATO DA PROFECIA MESSIÂNICA
Embora já se tenha
discutido alguns aspectos introdutórios do livro de Isaías no primeiro e
segundo capítulos, é preciso retomar algumas questões, particularmente em
relação ao contexto histórico em que surge o conceito de Emanuel, já que a
esperança que dele decorre se dá em meio a diversas crises institucionais. Do
ponto de vista histórico, Isaías exerce seu ministério profético em um momento
de crise política em Judá e Israel, com desdobramentos na vida religiosa e
cultural das tribos envolvidas. Desse modo, a percepção histórica e a reflexão
teológica tecem a narrativa a respeito do Emanuel.
1. Emanuel:
contexto histórico-social
O capítulo que versa
sobre o Emanuel está inserido numa intensa relação diplomática envolvendo Acaz
(735 - 716 a.C)1, rei de Judá, Resim, rei da Síria, e Peca (739 - 732 a.C)2, rei
de Israel. Os dois últimos pressionavam Acaz para participar de uma coligação
contra Tiglate-Pileser III (745 - 727 a.C), rei da Assíria. A recusa de Acaz em
formar um bloco contrário à política de expansão da Assíria fez com que Damasco
e Israel se articulassem para derrubá-lo, pois o objetivo seria criar um cisma
em Judá e inserir um governante vassalo fiel à coligação sírio-israelita,
conforme informa o texto de Isaías: “Porquanto a Síria teve contra ti maligno
conselho, com Efraim e com o filho de Remalias, dizendo: Vamos subir contra
Judá, e atormentemo-lo, e repartamo-lo entre nós, e façamos reinar no meio dele
o filho de Tabeal” (Is 7.5,6). Houve um ataque sem êxito contra Jerusalém. A
Síria, porém, anexou aos seus domínios o território de Elate. O texto de 2 Reis
descreve resumidamente esse episódio: “Então, subiu Rezim, rei da Síria, com
Peca, filho de Remalias, rei de Israel, a Jerusalém, à peleja; e cercaram Acaz,
porém não o puderam vencer. Naquele mesmo tempo, Rezim, rei da Síria, restituiu
Elate à Síria e lançou fora de Elate os judeus; e os siros vieram a Elate e
habitaram ali até ao dia de hoje (2 Rs 16.5,6).”3
1- A respeito de Acaz, conferir as informações apresentadas em 2 Reis 16. 1-20;
2 - A respeito de Peca, conferir as informações apresentadas em 2 Reis 15. 27-31;
3 - outra perspectiva dos eventos citados encontra-se em 2 Crônicas 28. 1-27
Ainda que a
coligação siro-israelita não tenha logrado êxito em relação à tomada de
Jerusalém, a anexação de Elate certamente impôs temor entre as autoridades e à
população em geral, como fica claro no texto de Isaías: “E deram aviso à casa
de Davi, dizendo: A Síria fez aliança com Efraim. Então, se moveu o seu
coração, e o coração do seu povo, como se movem as árvores do bosque com o
vento” (Is 7.2). Não obstante às claras advertências do profeta Isaías, Acaz se
sentia pressionado a buscar uma aliança com a Assíria para defender as
fronteiras de seus inimigos. Algo que o fez no momento oportuno, segundo o
livro de 2 Reis: “E Acaz enviou mensageiros a Tiglate-Pileser, rei da Assíria,
dizendo: Eu sou teu servo e teu filho; sobe e livra-me das mãos do rei da Síria
e das mãos do rei de Israel, que se levantam contra mim. E tomou Acaz a prata e
o ouro que se achou na Casa do Senhor e nos tesouros da casa do rei e mandou um
presente ao rei da Assíria. E o rei da Assíria lhe deu ouvidos; pois o rei da
Assíria subiu contra Damasco, e tomou-a, e levou o povo para Quir, e matou a
Rezim. Então, o rei Acaz foi a Damasco, a encontrar-se com Tiglate-Pileser, rei
da Assíria [...]” (2 Rs 16.7-10a).
A ajuda da Assíria
não saiu barato para Acaz, pois certamente se livrou da opressão
siro-israelita, porém não conseguiu se livrar dos tentáculos da dominação
política de seu aliado, uma vez que Judá passou à condição de vassalo da
Assíria. Acrescenta-se ainda aos problemas políticos de Judá a relativização
religiosa e cultural, bem como a questão da ética nas relações sociais. Nesse
sentido, há informações de que o rei Acaz cometeu muitos atos contrários à Lei
de Deus. Por exemplo, 2 Reis narra que Acaz “[...] não fez o que era reto aos
olhos do Senhor, seu Deus, como Davi, seu pai. Porque andou no caminho dos reis
de Israel e até a seu filho fez passar pelo fogo, segundo as abominações dos
gentios, que o Senhor lançara fora de diante dos filhos de Israel. Também
sacrificou e queimou incenso nos altos e nos outeiros, como também debaixo de
todo arvoredo” (2 Rs 16.2-4).
Não é possível
identificar por meio da narrativa acima até que ponto o comportamento do rei
Acaz se fazia presente também na população. Entretanto, não é exagero sugerir
que suas atitudes morais exerciam influência na vida dos habitantes de Judá.
Assim, o contexto histórico-social aponta para o fato de que a confiança na
proteção de Deus estava em baixa, para dizer o mínimo, já que se buscava o
socorro da potência política da época, a Assíria. Com isso, demonstrava-se a
ineficácia ou inexistência da memória libertadora do Êxodo, pois, mesmo diante
do poderio do império egípcio, houve uma inequívoca ação libertadora de Deus na
história.
2. Emanuel:
contexto histórico-teológico
O contexto
histórico-social apresentado anteriormente ilumina a ação profética de Isaías,
pois sua leitura teológica fundamenta-se no fato de que as ações de Acaz,
particularmente a aliança estabelecida com a Assíria, estavam mais alicerçadas
em pressupostos da lógica política e diplomática do que numa real e sincera
busca pelas orientações de Deus. A intervenção do profeta procura inicialmente
tranquilizar o aterrorizado rei Acaz. A orientação de Deus era: “E dize-lhe:
Acautela-te e aquieta-te; não temas, nem se desanime o teu coração por causa
destes dois pedaços de tições fumegantes, por causa do ardor da ira de Rezim, e
da Síria, e do filho de Remalias” (Is 7.4).
O que garante a
existência do povo de Deus não são as articulações políticas, já que, embora
necessárias, não dão conta da complexidade que envolve a existência de Judá.
Desse modo, Deus, por intermédio do profeta, esclarece de modo ininteligível:
“Entretanto, a cabeça de Efraim será Samaria, e a cabeça de Samaria, o filho de
Remalias; se o não crerdes, certamente, não ficareis firmes” (Is 7.9). Na
concepção teológica do profeta Isaías, a falta de confiança em Deus era o
principal entrave para a superação daquela situação, pois o mesmo Deus que agiu
na travessia do deserto em direção à Canaã traria salvação para a nação de
Judá. Diante da situação política que se desenhava, tendo, por um lado, a
coligação siro-israelita, e, por outro, os assírios, era necessário entregar a
situação ao conselho de Deus, pois Ele é o fiel cuidador do seu povo!
II - O SINAL DO “EMANUEL”
Quanto ao receio de
que a coligação siro-israelita obteria êxito no seu intento de desestruturar
Judá, inclusive tentando depor o seu rei, a resposta dada por Deus a Acaz, por
intermédio do profeta Isaías, foi a seguinte: “Assim diz o Senhor Deus: Isto
não subsistirá, nem tampouco acontecerá” (Is 7.7). Em outras palavras, não se
justificavam as atitudes de desespero e de alianças que trariam mais prejuízo à
nação. Tamanha era a convicção do arauto que procurou novamente Acaz para lhe
desafiar: “E continuou o Senhor a falar com Acaz, dizendo: Pede para ti ao
Senhor, teu Deus, um sinal; pede-o ou embaixo nas profundezas ou em cima nas
alturas” (vv. 10,11). A resposta de Acaz denotava sua incapacidade para assumir
desafios diante de Deus: “Acaz, porém, disse: Não o pedirei, nem tentarei ao
Senhor” (v.12). Conforme escreveu Raymond C. Ortlund: “Deus entregara um cheque
em branco a Acaz, mas ele se recusou a descontá-lo. Por quê? Porque não queria
confiar em Deus. E verdade que disse isso com palavras mais piedosas (Dt 6.16).
Mas tudo não passou de um rápido pensamento, de uma hipocrisia diplomática”.
Porém, a resposta de
Deus, por intermédio do profeta, é direta: “Portanto, o mesmo Senhor vos dará
um sinal: eis que uma virgem conceberá, e dará à luz um filho, e será o seu
nome Emanuel. Manteiga e mel comerá, até que ele saiba rejeitar o
mal e escolher o bem. Na verdade, antes que este menino saiba rejeitar o mal e
escolher o bem, a terra de que te enfadas será desamparada dos seus dois reis”
(Is 7.14-16).
A análise mais ampla
de Isaías sugere o cumprimento da profecia naquele contexto, podendo ser um
filho do rei Acaz ou do próprio profeta Isaías. O que se deduz dos versículos
15 e 16 do capítulo 7, em conexão com os versículos 3 e 4 do capítulo 8, que diz:
“E fui ter com a profetisa; e ela concebeu e deu à luz um filho; e o Senhor me
disse: Põe-lhe o nome de Maer-Salal-Hás-Baz. Porque, antes que o menino saiba
dizer meu pai ou minha mãe, se levarão as riquezas de Damasco e os despojos de
Samaria, diante do rei da Assíria” (Is 8.3,4). Um texto de Isaías pode estar se
referindo à profecia sobre o filho de Acaz: “[...] e passará a Judá,
inundando-o, e irá passando por ele, e chegará até ao pescoço; e a extensão de
suas asas encherá a largura da tua terra, ó Emanuel” (Is 8.8).
Por outro lado,
pode-se dizer também que as profecias se projetam para um futuro mais distante.
O que pode ser constatado nos versículos de 1 a 7 do capítulo 9 de Isaías:
“Mas a terra que foi
angustiada não será entenebrecida. Ele envileceu, nos primeiros tempos, a terra
de Zebulom e a terra de Naftali; mas, nos últimos, a enobreceu junto ao caminho
do mar, além do Jordão, a Galileia dos gentios. O povo que andava em trevas viu
uma grande luz, e sobre os que habitavam na região da sombra de morte
resplandeceu a luz. Tu multiplicaste este povo e a alegria lhe aumentaste;
todos se alegrarão perante ti, como se alegram na ceifa e como exultam quando
se repartem os despojos. Porque tu quebraste o jugo que pesava sobre ele, a
vara que lhe feria os ombros e o cetro do seu opressor, como no dia dos
midianitas. Porque toda a armadura daqueles que pelejavam com ruído e as vestes
que rolavam no sangue serão queimadas, servirão de pasto ao fogo. Porque um
menino nos nasceu, um filho se nos deu; e o principado está sobre os seus
ombros; e o seu nome será Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da
Eternidade, Príncipe da Paz. Do incremento deste principado e da paz, não
haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino, para o firmar e o fortificar
em juízo e em justiça, desde agora e para sempre; o zelo do Senhor dos
Exércitos fará isto” (Is 9.1-7).
Seria difícil
investigar todo o percurso histórico-linguístico do título Emanuel. Porém,
certamente o termo passa a fazer parte do vocabulário religioso judaico, sendo
acessado principalmente nos momentos de crises sociais e religiosas, como foi,
por exemplo, o cativeiro babilônico. A construção histórico-teológica da
expectativa messiânica no cativeiro babilônico impôs aos teólogos do período a
necessidade de buscar na tradição fundamentos que ancorassem a esperança do
povo. Desse modo, o Sinal do Emanuel extrapolaria a dimensão histórico-social
dos condicionamentos conceituais, inserindo-se na tradição veterotestamentária
como um conceito que se aplicaria a esperança messiânica.
Entretanto, o título
Emanuel também seria utilizado pelos cristãos, em particular quando se percebeu
a necessidade de se apresentar um fundamento histórico-teológico do caráter
messiânico de Jesus de Nazaré. É nesse sentido que se deve entender, por
exemplo, o emprego do termo pelo autor do Evangelho de Mateus.
Após a destruição de
Jerusalém no ano 70 pelo general romano Tito, muitos judeus migraram para
várias regiões da Palestina, sendo provável que judeus convertidos a Cristo
passaram a dividir o mesmo espaço geográfico com judeus de estrutura religiosa
farisaica, cujo centro religioso, na ausência do templo, era a sinagoga. A
expressão religiosa sinagogal sinalizava para a necessidade de se preservar a
identidade judaica, pois o momento de crise político-social demandava ações de
fortalecimento do vínculo identitário. É nesse contexto em que o Evangelho de
Mateus se insere, pois há o perigo de que judeus que se converteram a Cristo
sucumbam diante das políticas culturais de fortalecimento da identidade
judaica. Desse modo, a produção teológico-pastoral do autor do Evangelho de
Mateus se insere em uma comunidade cristã que procura se desprender do vínculo
ao judaísmo, particularmente de sua incredulidade messiânica, conservando,
porém, a continuidade histórico-teológica do Antigo Testamento, sendo uma das
questões-chave o fundamento veterotestamentário que atesta o caráter messiânico
de Jesus de Nazaré.
Ao contrário do que
a sinagoga ensinava - de que o messias ainda era uma espera - o evangelista
insiste que as escrituras se cumpriram em Jesus. Sendo assim, já não é mais
espera, e sim realidade presente que anima a comunidade. É nesse sentido que o
evangelista cita o sinal do Emanuel: “E ela dará à luz um filho, e lhe porás o
nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos seus pecados. Tudo isso
aconteceu para que se cumprisse o que foi dito da parte do Senhor pelo profeta,
que diz: Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e ele será chamado
pelo nome de Emanuel. (Emanuel traduzido é: Deus conosco)” (Mt 1.21-23).
Ainda que o
Evangelho de Mateus seja o único a apresentar uma relação histórica e teológica
entre o sinal do Emanuel de Isaías e a presença de Deus por intermédio do
nascimento de Jesus de Nazaré, o conceito teológico da presencialidade de Deus
em Cristo perpassa os escritos do Novo Testamento. Um dos textos mais antigos
sobre a habitação de Deus entre os homens é o hino cristológico que aparece na
carta escrita aos Filipenses por Paulo, provavelmente na segunda metade da
década de 50 d.C. Segue o texto: “De sorte que haja em vós o mesmo sentimento
que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por
usurpação ser igual a Deus. Mas aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de
servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem,
humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte e morte de cruz. Pelo que
também Deus o exaltou soberanamente e lhe deu um nome que é sobre todo o nome,
para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho dos que estão nos céus, e na
terra, e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor,
para glória de Deus Pai” (F1 2.5-11).
Do mesmo modo, o
Evangelho atribuído ao apóstolo João descreve o lógos pré-existente (Jo 1.14) que é confirmado em sua
epístola, quando procura discernir as compreensões sobre Jesus: “Nisto conhecereis
o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é
de Deus; e todo espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é
de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de
vir, e eis que está já no mundo” (1 Jo 4.2,3).
III - O DEUS ETERNAMENTE CONOSCO
Embora se esteja
trabalhando a ideia de “Deus conosco” (Emanuel) a partir da situação histórica
de Judá, é preciso levar em conta que as sagradas escrituras apresentam a
presença de Deus em toda a história humana. Por exemplo, a narrativa do Jardim
do Éden descreve a presença de Deus entre a criação, particularmente em sua
relação harmoniosa com o homem e a mulher. Deus passeava pelo Jardim (Gn 3.8),
o que sugere assiduidade na tratativa com o homem e a mulher, indicando,
também, uma relação de confiança e amizade. O pecado abalaria o relacionamento
com Deus. A proximidade e a confiança cederam lugar ao medo (Gn 3.10),
manchando para sempre o relacionamento entre Deus e o ser humano. A graça de
Deus, no entanto, foi oferecida ao primeiro casal, pois, se o pecado conduziria
à morte (Gn 3.3), a permissão para que vivessem com qualidade de vida seria uma
demonstração inequívoca da misericórdia e da generosidade de Deus. Mesmo com a
relação abalada por causa do pecado, Deus jamais deixou de desejar ardentemente
estar conosco. É o que mostra o relacionamento de Deus com os grandes
personagens da Bíblia Sagrada.
1. Ele esteve
com Israel
Um dos personagens a
quem Deus se revelou na antiguidade foi Abrão. E não somente isso, ele seria o
início de um projeto de nação desenvolvida e executada pelo próprio Deus.
Conforme a narrativa de Gênesis: “Ora, o Senhor disse a Abrão: Sai-te da tua
terra, e da tua parentela, e da casa de teu pai, para a terra que eu te
mostrarei. E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei, e engrandecerei o
teu nome, e tu serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem e
amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias
da terra” (Gn 12.1-3).
A partir de Abrão e
de sua descendência, Isaque e Jacó, surgiria a nação de Israel que desfrutaria
da presença de Deus. O Senhor faz uma aliança com o povo de Israel. Porém, a
garantia da presença dEle estava condicionada à fé, ou seja, na entrega
irrestrita do povo aos seus desígnios. O Novo Testamento reconhece o valor da fé
de homens e mulheres que, apesar de suas dificuldades, peregrinaram
fundamentados na fé em Deus (Hb 11.1-40). Foram homens e mulheres que
experimentaram o “Deus conosco”.
É correto afirmar
que, apesar de todos os problemas que o povo de Deus teve para permanecer fiel
à aliança, com tantas oportunidades que tiveram de experimentar sempre de novo
a misericórdia e a bondade de Deus, e apesar de reiteradamente optarem pela
desobediência, o Senhor permaneceu fiel à aliança com Israel, mesmo quando
estavam no cativeiro. O povo quase foi dizimado, mas Ele prometeu um resto (Is
10.19), um remanescente (Is 1.9; Sf 3.13) e finalmente, um que “brotará um
rebento do tronco de Jessé, e das suas raízes um renovo frutificará” (Is 11.1),
simbolizando o Messias, o Emanuel, que sobreviveriam a todas as destruições e
catástrofes.
Portanto, apesar de
não merecerem, Ele cuidou e esteve com seu povo por amor a toda humanidade (Jo
3.16). Esse Emanuel seria a concentração espiritual e santa de Israel, de tal
forma que o próprio Cristo foi a realização do pacto de Deus com Israel.
“Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; e o principado está sobre os
seus ombros [...]” (Is 9.6).
2. Ele está
conosco
Como já foi dito, em
Jesus de Nazaré se cumpriram todas as profecias bíblicas sobre a vinda do
Messias. Ele é o Cristo enviado de Deus para salvar a humanidade sofredora. O
Emanuel é a garantia de que, assim como foi com o povo de Israel, Ele também
está conosco, como Ele mesmo prometeu: “[...] eis que eu estou convosco todos
os dias, até à consumação dos séculos” (Mt 28.20). Assim se cumpre em nós a
promessa messiânica de que Ele, de fato, estaria conosco. O apóstolo João
escreveu: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória,
como a glória do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1.14). O
verbo “habitar” utilizado por João tem o mesmo sentido que o Emanuel utilizado
por Isaías. Ou seja, Deus agora habita definitivamente entre seu povo através
de Cristo e de seu sacrifício na cruz. “E, se o Espírito daquele que dos mortos
ressuscitou a Jesus habita em vós, aquele que dos mortos ressuscitou a Cristo
também vivificará o vosso corpo mortal, pelo seu Espírito que em vós habita”
(Rm 8.11).
A presença de Deus
ocorre em dimensões trinitárias, tendo em vista que o Pai, o Filho e o Espírito
Santo atuam harmoniosamente entre nós, dando-nos sentido e direção
existencial. Imbuídos da presença trinitária de Deus, homens e mulheres ousaram
romper barreiras étnico-culturais para levar o evangelho a todas as nações, cumprindo,
assim, a expansão do evangelho determinada por Jesus: “Mas recebereis a virtude
do Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me-eis testemunhas tanto em
Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e até aos confins da terra” (At 1.8).
Eles enfrentaram perseguições, resistiram aos falsos mestres, desafiaram os
poderosos deste mundo, pois se entendiam como portadores da fé no “Deus
Conosco”.
Do mesmo modo na
contemporaneidade, embora o mundo se apresente de modo diferente do vivenciado
pelos pais fundadores, a presencialidade de Deus ainda é manifesta de forma
inequívoca, principalmente no vínculo comunitário da comunhão. O mesmo Senhor
que foi “Deus conosco” por ocasião da angústia de Judá, será “Deus conosco” nos
momentos de crise da Igreja, já que: “[...] onde estiverem dois ou três
reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles” (Mt 18.20). A presença do
Emanuel transcende a existência e a história. Ele não apenas esteve com Israel,
mas também com toda a humanidade. Ele sempre esteve, está e estará conosco
provendo salvação, cura e cuidado de tudo e de todos. Convém estarmos atentos à
presença do Emanuel em nossas vidas, manifestando-a a outros que também
precisam dela para sobreviver aos conflitos, injustiças e percalços da vida.
3. Ele estará
conosco
O conceito do “Deus
conosco” também é revestido de concepções escatológicas, pois o conceito do
Emanuel não aponta somente para o passado ou presente, mas também é a garantia
de que, também no futuro, o Senhor estará entre seu povo, não apenas espiritualmente
e de forma limitada pelas contingências humanas, mas também com toda a sua
força e esplendor na plenitude do Reino de Deus. No entanto, o Reino de Deus
que se concretizará plenamente no mundo vindouro é também uma dimensão que
invade o presente. Jesus disse: “Mas se é pelo dedo de Deus que eu expulso
demônios, então chegou a vocês o Reino de Deus” (Lc 11.20 -NVI). O “Deus
conosco” nos convida a participarmos em seu Reino de justiça e paz, tendo em
vista que a presença do Reino de Deus implica em destronar o império do mal.
O Reino de Deus
caminha para o seu desfecho tendo a Igreja como protagonista da presença justa
de Deus no mundo. Assim, nós não somos apenas portadores da bênção do “Deus
conosco”, somos também sinais da presença de Deus no mundo. Desse modo, a
presença do Reino de Deus impõe à Igreja a responsabilidade de vivenciar e
testemunhar os seus valores, algo explícito nos capítulos 5 a 7 do Evangelho de
Mateus.
O Emanuel faria
parte, então, da esperança cristã da presença de Cristo na comunidade, motivo
de grande celebração, pois ressoa a promessa: “Eis que eu estou convosco todos
os dias, até à consumação dos séculos” (Mt 28.20). Essa promessa não pode ser
motivo para uma fé paralisada. Pelo contrário, o derramamento do Espírito Santo
tinha como propósito capacitar homens e mulheres para serem “testemunhas” (At
1.8). Do mesmo modo hoje, celebremos a presença do Senhor em todas as dimensões
da vida, testemunhando ao mundo os valores inefáveis do Reino de Deus,
aguardando ativamente o desfecho do Senhor. Conforme diz em apocalipse: “E ouvi
uma grande voz do céu, que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens,
pois com eles habitará, e eles serão o seu povo, e o mesmo Deus estará
com eles e será o seu Deus” (Ap 21.3).
Conclusão
O nascimento de Jesus traz consigo todo o
cumprimento das profecias messiânicas, desde os livros de Gênesis até Zacarias,
em número de mais de trezentas delas. Portanto, o Emanuel traz uma carga divina
tão grande que alcançou seu cumprimento salvífico em Israel e em toda a
humanidade carente de Deus. Mas a maior garantia de sua vinda ao mundo é que
Ele continua conosco e estará por toda a eternidade, quando seremos levados
para junto dEle.
A teologia do Emanuel pode ser entendida de três formas básicas: Ele esteve com o povo de Israel, Ele está com a Igreja ao longo da história, e por fim Ele estará plenamente com todos os redimidos e salvos no Novo Céu e na Nova Terra.
Fonte:
Lições Bíblicas - Isaías - Eis-me aqui, envia-me a mim. 3º.trim_2016 CPAD - Clayton Ivan Pommerening
Livro de Apoio - Isaías - Eis-me aqui, envia-me a mim. - Clayton Ivan Pommerening
Guia do leitor da Bíblia - CPAD
Bíblia de Estudo Pentecostal
Bíblia de Estudo Defesa da Fé
Bíblia Nova Versão Internacional
Dicionário Bíblico Wycliffe
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